Defesa da Laranja Podre: A Culpada ou a Vítima do Sistema?


Senhores e senhoras do júri, venho hoje defender aquela que sempre foi injustamente condenada: a laranja podre. Durante muito tempo, essa laranja foi acusada de corromper todo o saco, de ser a raiz do problema, de arruinar as demais. Mas pergunto a vocês: essa laranja realmente escolheu apodrecer?

 

Vamos aos fatos. A laranja não tem autonomia para escolher onde ficará dentro do saco. Não pode se mover, respirar livremente ou reivindicar espaço. Se ela se encontra esmagada no fundo, sofrendo a pressão das demais, sem ventilação, sem a luz do sol que todas merecem, isso não é um cenário de decadência inevitável?

 

E mais: se o responsável pelo saco tivesse o devido cuidado de movimentar as laranjas, garantindo que todas tivessem uma chance de respirar, de estar no topo e de receber um novo fluxo de ar, essa laranja não teria sobrevivido por mais tempo? Não teria cumprido seu propósito até o fim, sem ser jogada fora prematuramente e sem carregar a culpa de um problema que não foi causado por ela?

 

O verdadeiro culpado não é a laranja que apodreceu, mas sim o descaso, a negligência e a falta de gestão do sistema que a colocou naquela posição de vulnerabilidade. A podridão não nasce da maldade, mas da falta de cuidado e do abandono.

 

Portanto, peço que reconsideremos esse julgamento precipitado. Não condenemos a laranja podre. Em vez disso, reconheçamos que sua deterioração é um alerta para a necessidade de mudança no sistema, para que todas as laranjas tenham seu tempo justo e possam cumprir seu papel sem serem esmagadas antes da hora.

 

A laranja podre não é a vilã. Ela é a vítima de um sistema que não soube cuidar dela. E se quisermos preservar o saco todo, não devemos eliminá-la, devemos entender por que ela apodreceu e mudar as condições para que isso não se repita.

 

Mas antes que a defesa realmente descanse, faço um último apelo à razão e à justiça. Se condenarmos a laranja podre sem olhar para as circunstâncias que a levaram à sua condição, estaremos apenas perpetuando o erro.

 

O verdadeiro perigo nunca foi a laranja em si, mas sim a negligência do observador. O descaso, a falta de movimento, a ausência de cuidado, esses são os verdadeiros agentes da deterioração. Se houvesse um olhar atento, um gesto de reorganização, uma simples mudança de posição, talvez essa laranja jamais chegasse ao estado pelo qual agora é julgada.

 

E se, ao invés de descartá-la sumariamente, investigássemos suas razões? Talvez descobríssemos que ela não apodreceu primeiro porque era fraca, mas porque talvez tenha sido colocada no fundo do saco, em uma posição de desgaste contínuo. Talvez a pressão das demais tenha sido grande demais. Talvez lhe faltasse o oxigênio necessário para manter-se íntegra.

 

E o mais irônico, senhores e senhoras, é que a laranja podre, ao ser apontada como culpada, carrega consigo um último e valioso ensinamento: a fragilidade de uma pode ser o sintoma de um problema maior, um problema que, se não for corrigido, seguirá se repetindo com outras laranjas.

 

Portanto, ao invés de simplesmente descartá-la e seguir cegamente com os mesmos hábitos, devemos aprender com ela. Pois enquanto a acusarmos sem refletir, estaremos apenas condenados a encher novos sacos de laranjas que, cedo ou tarde, sofrerão o mesmo destino.

 

Que este julgamento não seja o fim da laranja podre, mas sim o despertar de uma nova consciência sobre o verdadeiro culpado: a falta de atenção e de equilíbrio dentro do sistema.

Pois enquanto houver laranjas apodrecendo antes do tempo, esmagadas pela pressão de um sistema que não se movimenta, será necessário continuar questionando: quem realmente é o culpado?

 

Se ignorarmos essa realidade e continuarmos descartando aquelas que sucumbem primeiro, seguiremos perpetuando o mesmo ciclo. As próximas laranjas, inevitavelmente, sofrerão o mesmo destino. E então, novas culpadas serão apontadas, enquanto o verdadeiro problema permanece intocado.

 

O que seria da laranja podre se, em vez de ser rejeitada, fosse compreendida? Se, em vez de ser isolada, fosse analisada como um sintoma e não como a doença? O que seria da sociedade se aprendesse a observar melhor os sinais de alerta ao invés de condenar aqueles que, pelo peso da estrutura, cederam primeiro?

 

A laranja podre é, na verdade, um espelho do sistema que a produziu. Seu estado não é um desvio, mas uma consequência. E ignorá-la é ignorar a própria origem do problema.

 

A defesa resiste porque não luta apenas por essa laranja, mas por todas as que virão depois dela. Luta para que, no futuro, nenhuma laranja seja esmagada e esquecida sem que antes tenha sido ouvida.

 

E assim, com convicção, afirmo: a laranja podre não é o fim, mas o começo de uma mudança necessária.

 

Que este julgamento não termine com uma condenação, mas com uma transformação.

 

Pois toda laranja que apodrece antes do tempo carrega consigo uma história que precisa ser ouvida. Não é sua fraqueza que a condena, mas a falta de espaço para respirar, a pressão que a esmaga, a negligência do observador que não percebeu sua necessidade de movimento.

 

E se hoje a laranja podre está no banco dos réus, que seja para revelar uma verdade maior: nenhuma laranja nasce podre. Nenhuma laranja deseja apodrecer. Sua deterioração é um sintoma, não um crime.

 

Que este tribunal olhe além das aparências. Que enxergue, nas fibras enfraquecidas da fruta acusada, a marca de um sistema falho. Que compreenda que a podridão não começa na laranja, mas na estrutura que a mantém imóvel, sufocada, esquecida no fundo do saco.

 

Se condenarmos essa laranja sem reconhecer a injustiça de sua condição, apenas repetiremos o erro. Outros frutos seguirão o mesmo caminho. E então, de novo, apontaremos culpados ao invés de corrigirmos as falhas.

 

A defesa não apenas luta pela laranja podre. Luta pelo saco inteiro. Luta por um sistema onde cada laranja possa cumprir seu propósito sem ser esmagada antes da hora.

 

A defesa não se cala. E jamais se calará enquanto houver laranjas sendo condenadas por um destino que não escolheram.

 

Pois se há podridão, que não seja silenciada. Que não seja varrida para longe, disfarçada sob o véu do esquecimento. Que seja, ao contrário, reconhecida como um alerta, como um chamado urgente para mudar aquilo que de fato está errado.

 

O sistema que hoje julga a laranja podre finge não perceber que ele próprio a tornou assim. E, pior, recusa-se a admitir que, se nada mudar, outras laranjas seguirão o mesmo caminho. O problema nunca foi a fruta isolada, mas a forma como o saco é organizado, como o peso é distribuído, como o cuidado é negligenciado.

 

A defesa não pede clemência, pois não há crime. A defesa não suplica piedade, pois não há culpa. A defesa exige consciência, responsabilidade, transformação.

 

E se esse tribunal insistir em apontar o dedo apenas para a laranja caída, se recusar a ver a verdade além da superfície, então não será um julgamento, será um teatro. Um espetáculo cego de hipocrisia, onde se condena a consequência e se ignora a causa.

 

Mas enquanto houver laranjas sendo esmagadas sem que ninguém questione por quê, enquanto houver ciclos de destruição que poderiam ser evitados, a defesa não recuará.

 

A defesa grita. A defesa exige justiça. A defesa não aceita que a história continue se repetindo.

 

Pois ou corrigimos o erro agora, ou estaremos apenas esperando a próxima laranja podre para culpar.

 

 

Nota do Autor

 

A reflexão acima nasceu de um episódio real que presenciei, onde um conflito familiar culminou na exclusão de um de seus membros, rotulado há anos como a "laranja podre" do grupo. Alguém que, desde sempre, carregava o estigma da inadequação, da diferença, da ovelha negra.

 

Observando essa dinâmica, e considerando que minha esposa e minha filha são advogadas, lancei-lhes um desafio: e se, em vez de aceitarmos passivamente esse rótulo, construímos uma defesa para essa laranja? E se, em vez de simplesmente descartá-la, olhamos para o sistema que a colocar nessa posição?

 

A metáfora do saco de laranjas surgiu naturalmente. O peso das demais frutas, a falta de movimento, a negligência do observador. Será que a deterioração realmente começa na laranja ou é consequência do ambiente em que foi colocado? Será que, em vez de apenas apontar algumas suspeitas, não deveríamos questionar as condições que levam uma pessoa a ser marginalizada dentro de sua própria família?

 

Essa provocação nasceu essa reflexão. Uma tentativa de ampliar a visão sobre aqueles que são rejeitados, não por serem intrinsecamente ruíns, mas por carregarem dores, histórias e vivências que os afetaram. Afinal, será que o problema é realmente a laranja podre ou a forma como o saco de laranjas é organizado?

 

Que esta reflexão sirva como um convite à empatia e ao questionamento. Pois antes de condenarmos alguém ao abandono, talvez devêssemos perguntar: quem realmente falhou?


Bom domingo a todos!!!

Clovis de Vasconcelos








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